Você faz o melhor treino em pista da sua vida. Quatro repetições de
1.600 metros, e sente-se como Kiptanui.
Então, fica de bobeira, com suas roupas molhadas de suor, conversando com
outros corredores e saboreando a atmosfera. Na manhã seguinte acorda como
se o exército russo estivesse marchando em sua garganta. Você tem gripe.
Treinamento de velocidade suprime seu sistema imunológico fazendo com que
você fique doente?
A
resposta não é clara. O sistema imunológico é uma combinação
complexa de linfócitos, leucócitos, imunoglobinas, eosinofilas, células
assassinas naturais, e outras feras; cada qual com seu papel único na
proteção de nosso organismo contra doenças. Porém, pesquisa recente da
McMaster University, em Ontário no
Canadá, levanta alguns pontos interessantes sobre a corrida e o sistema
imunológico.
Em
um estudo, publicado na edição de Agosto de 1995 da Medicine and Science in
Sports and Exercise, Dr. J. Duncan MacDougall e colegas
investigaram os efeitos do treinamento no sistema imunológico de
corredores de longa distância. Diferente de estudos anteriores, o
grupo do Dr. MacDougall examinou os
efeitos do aumento da intensidade e/ou volume do treinamento no sistema
imunológico, tanto agudos (efeitos imediatos), quanto crônicos (efeitos
a longo prazo). Entrei em contato com Dr. MacDougall
para saber mais a respeito dos resultados e suas implicações para os corredores.
Nesse
estudo, dois grupos de seis corredores cada treinaram por 40 dias divididos
em 4 fases de treinamento de 10 dias. O volume e intensidade do
treinamento mudava com as fases. O Grupo 1 correu em volume baixo e pouca
intensidade durante a primeira fase, seguindo de alto volume e baixa
intensidade na segunda fase, baixo volume e pouca intensidade novamente da
terceira fase, e volume elevado e alta intensidade na fase final. O Grupo
2 seguiu o mesmo protocolo, porém trocou as fases 2 e 4. "Baixa
intensidade" significava correr a 50-70% do VO2
máximo, enquanto
"alta intensidade" envolvia correr repetições de 1.000 metros
a 95-100% do VO2 máximo a cada dois
dias. "Volume baixo" representava a distância de treinamento
típica de cada corredor, enquanto que durante as fases de "volume
elevado" os corredores faziam o dobro da quilometragem normal.
O
que o estudo descobriu? MacDougall
e colegas descobriram reduções nas taxas de células "ajudantes da
imunidade" em relação às células "supressoras da
imunidade" tanto no treinamento intenso quanto de volume. Dr. MacDougall
conta, "essa taxa é um marcador da função imunológica e
sua redução indica uma elevação da susceptibilidade a
infecções." O sistema imunológico dos corredores ficou mais
enfraquecido pelo aumento da intensidade do treinamento do que pela
elevação do volume.
Dr.
MacDougall também descobriu que o sistema imunológico dos corredores se
adaptava à elevação da intensidade e volume do treinamento durante os
10 dias das fases. Isso sugere que você estará sob maior risco de ficar
doente depois da primeira sessão de treino forte, mas seu sistema
imunológico se adapta relativamente rápido ao aumento de estresse.
Quanto
tempo leva para o seu sistema imunológico se recuperar? No
estudo do
Dr. MacDougall, a taxa entre as células ajudantes e supressoras da
imunidade dos estudados retornou ao normal no dia seguinte ao treino. Esse
estudo não se concentrou em quantas horas o sistema imunológico levou
para se recuperar, porém Dr. MacDougall
declara, "outros estudos têm descoberto que essa taxa retorna ao
normal entre 30-90 minutos depois do exercício físico." Porém,
há evidência que outros elementos do sistema imunológico podem levar
mais tempo para se recuperarem. Em um estudo recente, conduzido por Dr. David
Nieman e colegas na Loma Linda University, o sistema imunológico
de 10 maratonistas experientes foi analisado depois de correrem por 3
horas até a exaustão. Esse estudo descobriu alterações em vários
tipos de células do sistema imunológico durante a recuperação. Porém,
todas essas alterações, exceto uma, retornaram ao normal dentro de 21
horas depois da corrida. Esses resultados sugerem que alterações no
sistema imunológico, mesmo depois de 3 horas muito extenuantes de
corrida, retornam ao normal em menos de um dia.
Quais
são as implicações para o seu treinamento? Os
resultados da
McMaster University indicam que você não deve elevar bruscamente a
intensidade ou volume do seu treinamento porque isso pode sobrecarregar
seu sistema imunológico. A subseqüente supressão do sistema
imunológico, embora de curto prazo, pode abrir as portas para doenças.
Desta forma, você deve tomar mais precauções quando adicionar treinos
de velocidade, competições ou quilômetros extras ao seu programa de
treinamento. Jason
Kajiura, estudante graduado que trabalhou com Dr. MacDougall e que também treina
corredores do Hamilton Olympic Club,
acrescenta: "Você está mais susceptível a infecções ao final do
treino e nas primeiras duas horas seguintes, então não deve fazer
treinamentos intervalados com um parceiro de treinos que esteja doente.
Também não saia para tomar umas cervejas depois do treino com ele."
Quais
são suas chances de ficar doente? Um
estudo anterior do Dr. Nieman,
envolvendo 2 mil corredores que competiram na Maratona de Los Angeles,
indicou que nosso sistema imunológico pode de fato ser suprimido o
suficiente pela corrida forte a ponto de aumentar o risco de ficarmos
doentes. Esse estudo descobriu que corredores que treinaram mais de 96 km
por semana tinham o risco duas vezes maior de ficar doente nos 2 meses
antes da maratona do que os que correram 32 km por semana. Esse
estudo também comparou as taxas de doenças durante a semana posterior à
maratona entre corredores que treinaram para a ela mas não a correram (vamos chamá-los de desistentes) em relação aos que realmente
participaram da prova. O resultado foi que 2% dos "desistentes"
ficaram doentes na semana seguinte à maratona, enquanto 13% dos que
participaram da corrida adoeceram. Isso certamente leva a parecer que
treino duro de alta quilometragem, ou correr uma maratona, pode aumentar
as chances de ficar doente. Entretanto,
devemos ter cautela ao ler demais as descobertas desses estudos. Dr. E. Randy
Eichner, Professor
da Medicine at the
University of Oklahoma, afirma que fatores fisiológicos geralmente
determinam o impacto do exercício sobre o sistema imunológico. Dr Eichner
escreveu na The Physician and Sportsmedicine: "Se exercícios
melhoram a imunidade ou
a suprimam, depende de se eles são uma alegria ou um
estresse". Uma atitude positiva em relação à sua corrida pode
ajudá-lo a manter-se saudável. Se
o seu sistema imunológico ficará suprimido suficientemente pela corrida
forte ou competição a ponto permitir que você fique doente dependerá da
idiossincrasias do sistema imunológico individual e seu nível de
estresse geral. Porém, os resultados da McMaster University
sugerem que estamos sob maior risco imediatamente depois de elevar a intensidade ou volume do
treinamento.
|